Juristas denunciam irregularidades no destino de multas da Lava-Jato

By Victor Rafael out16,2023

Um grupo de juristas publicou nesta segunda-feira, 16, dados que mostram como foram destinadas as multas pagas em acordos, delações e sequestros de bens da Lava-Jato. Conforme o documento divulgado pelo Observatório da Lava-Jato (OLAJ), uma tabela que detalha a divisão desses montantes, órgãos de persecução penal brasileiros — Ministério Público Federal e Polícia Federal — receberam cerca de 10 bilhões de reais, e há registros de parcelas endereçadas a órgãos na Suíça (em um total de 982 milhões de reais) e nos Estados Unidos, para onde foram endereçados 1,3 bilhão de reais. Para membros do grupo, o procedimento é irregular, já que esses valores deveriam permanecer em conta jurídica da União até que os processos se encerrassem, antes de serem enviados às entidades lesadas.

O material, uma tabela detalhada com oito páginas, coloca luz sobre acordos de leniência bilionários como os firmados com Andrade Gutierrez, Braskem, Camargo Corrêa, OAS e Odebrecht, além de dezenas de delações. Boa parte dos compromissos firmados com a força-tarefa, no entanto, permanecem sob sigilo, o que é alvo de críticas de um dos membros do observatório, o jurista Fernando Fernandes. Fazem parte do grupo ainda Carol Proner, Lenio Streck, Ney Strozake e Charlotth Back. A intenção é dar maior transparência e assegurar o registro histórico do que foi feito durante a Lava-Jato.

“Esperamos que seja levantado o sigilo de todos os processos de sequestros de bens, delação premiada e leniência para que todos tenham acesso. O segredo de Justiça nesses processos só era justificável no início das operações, quando, para a efetividade das constrições, precisava estar em sigilo. Mas, agora está na hora de terminar o sigilo, e que possamos todos nos debruçar sobre esses dados. Porque só o que o observatório está trazendo já é, de certa forma, escandaloso”, pontua Fernandes.

Na bilionária leniência firmada com a Braskem, com multa de 3,1 bilhões de reais, por exemplo, o acordo previa a destinação de 2,2 bilhões de reais ao MPF, cerca de 500 milhões de reais a órgãos norte-americanos e outros 310 milhões à Procuradoria-Geral da Suíça. Operação parecida foi feita no caso da Odebrecht, cujo acordo foi alvo de decisão recente do ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli, que anulou provas colhidas e criticou a atuação da Lava-Jato. No compromisso firmado com a Camargo Corrêa, com multa de 700 milhões de reais, quase 90% foi destinado às “investigações da Lava-Jato”, um montante de 625 milhões de reais.

Segundo Fernandes, a homologação de acordos em conjunto com órgãos internacionais, firmados por uma procuradoria de primeira instância, é uma ofensa aos interesses nacionais e se soma às relações extraoficiais da Lava-Jato com autoridades estrangeiras, sem a devida cooperação formal. Ele  também explica que “os valores deveriam estar de posse do Judiciário, em uma conta da União, para quando terminarem os processos, os valores serem destinados, no caso de condenação transitada em julgado, às vítimas”. O jurista complementa ao dizer que houve interpretação equivocada da legislação.

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“A legislação criada permitiu que bens que fossem perecíveis pudessem ser vendidos antes do trânsito em julgado. É o caso de lanchas, aviões, carros. Para venda, ou uso pelas corporações, por exemplo. Para evitar que esses bens percam valor ao final do processo. Só que a força-tarefa se utilizou dessa lei para pagar dinheiro, que não perece. Uma outra coisa seria se esses valores estivessem em um banco, em uma conta da União vinculada ao processo, mas não o pagamento. Os dados demonstram desvio de finalidade”, afirma.

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